domingo, 14 de dezembro de 2014

“Comum” latino-americano em matéria de proteção de direitos humanos

Por Jânia Maria Lopes Saldanha
No dia de hoje e de amanhã a cidade mexicana de Vera Cruz viverá um momento histórico. É a cidade sede da XXIV Conferência Ibero-americana[2] na qual estarão reunidos representantes dos 22 países membros e de inúmeros setores e organismos da sociedade civil, como indica a composição dos foros e encontros que serão realizados para debater as mais variadas temáticas.
O Presidente mexicano Enrique Peña-Nieto manifestou-se no dia de ontem, em alguns periódicos internacionais[3], sobre essa importante Conferência que terá como tema “Educação, Inovação e Cultura”.
Peña-Nieto finalizou sua manifestação repetindo as palavras pronunciadas pelo então Rei Juan Carlos de Espanha na Primeira Conferência realizada em 1991 na cidade de Guadalajara quando destacou que “por cima das nossas preocupações nacionais, desponta um sentimento comum que todos partilhamos: a vontade de trabalhar juntos pelo bem-estar e prosperidade dos nossos povos.”
Considerando essa manifestação, o Presidente do México destacou que a Cimeira de Vera Cruz viabilizará que a região da Ibero-américa consolide-se como uma região inclusiva e que “privilegie a formação integral das novas gerações.”
Feitos esses registros iniciais vale a pena pensar na relação que existe entre: a)  o tema da XXIV Conferência – educação, inovação e cultura ; b)  as palavras de Peña-Nieto que repetem as do então Rei de Espanha – sentimento comum de que todos partilhamos – e as suas próprias – que a Ibero-américa seja uma região inclusiva e que privilegie a formação integral das novas gerações; c) os recentes episódios de violência experimentados pela sociedade mexicana e; d) a possibilidade de construção de um direito “comum” constitucional e convencional na América Latina.
De fato, o trágico e ainda não completamente esclarecido episódio que resultou no desaparecimento de 43 jovens no Estado de Guerrero, no México e que aponta como principal responsável as forças policiais desse País, é apenas a ponta do iceberg cuja substância é composta basicamente da relação entre o crime organizado transnacional, a exclusão social, a conivência dos agentes políticos e das instituições públicas e o histórico quadro de violações de direitos humanos presente no México quanto também em grande parte dos países do continente americano.
mexicoEvidentemente, os registros de violência que envolvem assassinatos em massa e desaparecimentos forçados que têm devastado a sociedade mexicana em alguns lugares não correspondem à notória generosidade e ao comprometimento com o respeito aos direitos humanos que podem ser tributados ao povo mexicano. Prova disso são as manifestações populares que se espalharam por todo o País após o crime de Guerrero clamando por medidas governamentais efetivas para encontrar as vítimas, responsabilizar os autores e para evitar que fatos de tal natureza sejam repetidos.
Entretanto, por conta dessa trágica realidade que coloca o México no grupo de Estados que agasalha a prática de crimes contra a humanidade é que a FIDH – Federação internacional dos direitos humanos[4] em conjunto com a Comissión mexicana de promoción e defensa de los derechos humanos e outras instituições de defesa de direitos humanos apresentou no mês de setembro de 2014 comunicado ao Procurador Geral do Tribunal Penal Internacional relativo à prática de tais tipos de crimes relativos ao período de 2006 a 2012.
Assim, o silêncio em fazer referência a essa cruel realidade, tal como se observa na manifestação do Presidente mexicano, colide com o reconhecimento que ao mesmo tempo ele faz acerca “do sentimento comum de que todos partilhamos para a formação integral das novas gerações”. Assim, embora o México seja signatário da Convenção interamericana de direitos humanos e sua Constituição[5] preveja no art. 1º a proteção integral dos direitos humanos, há reconhecidamente uma forte e permanente violação desses direitos.
O caso mexicano, um entre tantos outros conhecidos e de natureza similar ocorridos na América Latina é trazido nesse momento em consideração à sua atualidade e à sua repercussão internacional. Serve ele, assim, para convidar o leitor a pensar na ambivalência entre as práticas políticas de Estados democráticos que violam os direitos humanos e o quadro normativo protetivo desses mesmos direitos. Afinal, a pergunta que não quer calar é: qual é o papel do direito?
Parece ser possível encontrar algumas respostas para entender as situações complexas e persistentes de violações de direitos humanos em nosso continente, quanto também para buscar soluções, a partir da compreensão da noção de “comum”.
“Comum” entendido não a partir da teoria dos “bens comuns mundiais” ainda em muito associada aos interesses econômicos, justamente porque o discurso mobilizado em torno desses bens, ocorrido na década de 90 do Século passado, nasceu junto aos pensadores da ciência econômica. Por outro lado, tampouco   deve ser associado à noção de “patrimônio comum da humanidade”, em razão da dependência dessa categorização às declarações de direitos. O “comum”, então, compreendido como um princípio político que anima tanto a atividade coletiva dos indivíduos na construção da riqueza da vida e da democracia, quanto a capacidade de exercer o autogoverno no exercício dessa atividade.
Como afirmam Dardot e Laval[6] um verdadeiro conceito de “comum” somente pode ser produto de uma práxis política e, assim, compor-se de um processo instituinte, ou seja, o “comum” encontra sua origem não em “objetos ou condições metafísicas, mas somente na atividade”. Desse modo, os movimentos sociais contrários à violação de direitos humanos, praticadas diretamente pelos Estados ou com a sua conivência, representam uma viva experiência do princípio político do “comum”. O movimento nas “praças”, a primavera árabe, as lutas estudantis, as mobilizações populares em defesa do acesso aos recursos naturais, o movimento dos indignados na Espanha ou os acampamentos em Wall Street são esboços dessas práxis.
Resta saber, enfim, em que medida os movimentos sociais impactam os centros decisórios de modo a pressioná-los a tomar medidas concretas capazes de transformar a realidade concernente à violação de direitos humanos. Irá o Procurador do Tribunal Penal Internacional acolher a comunicação feita pelas organizações representativas da sociedade contra autoridades mexicanas? Avançará o governo em suas até agora débeis proposições[7] para reduzir, senão debelar as violações de direitos humanos no México e, concretizar o “sentimento” comum para a formação integral das novas gerações?
É preciso reconhecer, finalmente, que o direito constitucional latino-americano apresenta um quadro que, segundo Armyn Von Bogdandy[8], é capaz de envolver a noção de “comum” ancorada no surgimento de um novo direito público na região e que faz a síntese entre as velhas tensões entre o plano nacional e o internacional. Mas mais do que isso, esse direito constitucional “comum” se inspira em três princípios: a) direitos humanos; b) Estado de direito e; c) democracia. Bogdandy chama a atenção para o fato de o direito não dever ser entendido apenas como expressão de poder e sim como capacidade emancipadora. Desse modo, como se sabe, as estruturas e o espaço estatal não são mais suficientes. O reconhecimento do direito constitucional “comum” latino americano, segundo o autor referido, não dispensa o Estado pelo contrário, mas requer dele uma abertura ao internacional e aos marcos normativos protetivos de direitos humanos.
Para o que interessa à proposição deste ensaio, vale chamar a atenção para um dos elementos marcantes desse ius constitucional commune latino americano: a inclusão de todos aos grandes sistemas sociais protetivos, como educação, saúde, trabalho, seguridade, com vistas a combater e reduzir toda forma de exclusão.  Tal compreensão permite então, fazer o encontro dessa teoria jurídica do “comum” constitucional – e para nós, também, do comum convencional – latino-americano em matéria de proteção de direitos humanos com o “princípio político do comum” que é tanto atividade quanto capacidade de auto-organização da própria sociedade.
Será mesmo possível acreditar que a XXIV Conferência Ibero-americana produzirá elementos concretos que comprometam os Estados, mais ainda, a reconhecer, respeitar e promover a existência de um direito “comum” constitucional e convencional na América Latina, cujo farol iluminador seja a formação integral das novas gerações a fim de evitar a produção de “vidas desperdiçadas”.[9]
Jânia Maria Lopes Saldanha é Doutora em Direito. Realiza estudos de pós-doutorado junto ao IHEJ – Institut des Hautes Études sur la Justice quanto também junto à Université Sorbonne Paris II – Panthéon-Assas. Bolsista CAPES Proc-Bex 2417146. Professora Associada do PPG em Direito da UFSM. Advogada.

[2] Disponível em http://www.24cumbreiberoamericana.gob.mx/.
[3] Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/12/1558487-enrique-pena-nieto-ibero-america-nova-pagina-na-sua-historia.shtml e http://www.publico.pt/mundo/noticia/iberoamerica-escrevendo-uma-nova-pagina-na-nossa-historia-comum-1678616?utm_source=feedburner&utm_medium=feed&utm_campaign=Feed%3A+PublicoRSS+(Publico.pt).
[4] Disponível em http://www.ldh-france.org/violences-au-mexique-ldh-fidh-interpellent-gouvernement-francais/
[5] Disponível em: http://www.ordenjuridico.gob.mx/Constitucion/cn16.pdf
[6] DARDOT, P. LAVAL, C. Commun. Essai sur la sur la Révolution au XXiéme siècle. Paris: La Découverte, 2014
[7] A crítica é apresenta pela Comissão mexicana de defesa e proteção dos direitos humanos. Disponível em: http://cmdpdh.org/category/comunicados/.
[8] Ius constitutionale commune en America Latina: rasgos, potencialidades e desafios, p. 23-46. Disponível em : http://biblio.juridicas.unam.mx/libros/7/3271/10.pdf
[9] A expressão é de Zygmunt Bauman.

Le carnet du GEREP - Séminaire de recherche 2014-15

Fonte: http://republique.hypotheses.org/

L’objet de ce séminaire est en premier lieu d’accueillir les explorations auxquelles se livre le GEREP, dont l’objectif est de renforcer la visibilité et la dynamique des théories politiques républicaines et celles portant sur le bien commun, et de lui permettre de développer ses pistes d’interrogations philosophiques dans les meilleures conditions. Néanmoins, il ne s’agit pas d’établir un pré carré républicain ne s’adressant qu’à ses défenseurs les plus convaincus. Ce séminaire cherche au contraire à accueillir les positions les plus diverses pour créer la discussion la plus pertinente et la plus fertile possible des « options républicaines », en s’appuyant sur la diversité des thématiques de recherche des organisateurs (philosophie politique, éthique, théorie du droit, théorie économique, historiographie).
Conformément aux principes qui structurent le GEREP, ce séminaire se veut donc un espace :
  • de discussion dans une optique de recherche universitaire
  • de pluralisme conceptuel, c’est-à-dire le lieu de débats d’idées contradictoires
  • de pluralisme disciplinaire, en ouvrant la discussion à la plus grande diversité possible des approches (philosophie, sciences politiques, sociologie, droit, économie, histoire etc.)
Séance 1 - Biens communs et politiques des communs
Jeudi 11 décembre 2014, 18h-20h
Lieu : Centre Maurice Halbwachs, ENS, 48 bvd Jourdan, 75014 Paris (salle de réunion)
  • Sebastien Broca (Post-doctorant, LabEx SITES/CEPN), « Quelques remarques critiques sur Commun de Pierre Dardot et Christian Laval »
  • Jânia Maria Lopes Saldanha (Professeur de droit, Universidade Federal de Santa Maria de Rio Grande do Sul, Brésil), « Le défi pour construire l’idée du “commun”: Réflexions sur l’effectivité des droits fondamentaux sociaux »
Discutant : Pierre Crétois (ATER en philosophie à l'Université François Rabelais de Tours)
Séance 2 – Républicanisme et cosmopolitisme
Jeudi 5 février 2015, 14h-16h
Lieu : Centre Maurice Halbwachs, ENS, 48 bvd Jourdan, 75014 Paris (salle de réunion)
Intervenants : Marc Bélissa et Valéry Pratt
Discutant : Rémi Clot-Goudard
Séance 3 – La république et la famille
Jeudi 9 avril 2015, 18h-20h
Lieu : Centre Maurice Halbwachs, ENS, 48 bvd Jourdan, 75014 Paris (salle de réunion)
Intervenants : Anne Morvan et Gabrielle Radica
Discutante : Stéphanie Roza
Séance 4 – La république et les mandats en Révolution
Jeudi 11 juin 2015, 18h-20h
Lieu : Centre Maurice Halbwachs, ENS, 48 bvd Jourdan, 75014 Paris (salle de réunion)
Intervenants : Erwan Sommerer et Claude Guillon
Discutante : Stéphanie Roza
Séance 5 – La république et l'éducation
Jeudi 18 juin 2015, 18h-20h
Lieu : Centre Maurice Halbwachs, ENS, 48 bvd Jourdan, 75014 Paris (salle de réunion)
Intervenants : Christophe Miqueu et Edern de Barros
Discutant : Naël Desaldeleer
Comité d’organisation : Thomas Boccon-Gibod, Rémi Clot-Goudard, Pierre Crétois, Edern De Barros, Naël Desaldeleer, Edouard Jourdain, Cédric Rio, Stéphanie Roza.